HÉRMIA - Formosa Helena, por que tanta pressa?
HELENA - Eu, formosa? Desmente-te depressa.
Ama Demétrio a tua formosura;
nesses olhos encontra a luz mais pura;
acha ele em tua voz mais melodia
do que o pastor na doce cotovia,
quando o trigo nos campos enverdece
e o pilriteiro de botões se tece.
Se, como as doenças, fosse contagiosa
também a formosura, eu, jubilosa,
me fizera infectar, ó Hérmia bela!
de teus encantos, sem maior cautela;
com tua voz ficara nos ouvidos;
teu olhar, nestes olhos combalidos;
tua fala de música esquisita
consolidar viria a minha dita.
Se o mundo fosse meu, ficando fora
Demétrio, de todo ele, sem demora,
me desfizera, caso conseguisse
tua beleza obter, tua meiguice,
porque sendo, como és, o meu contraste,
seu coração bondoso conquistaste. HÉRMIA - Faço-lhe cara feia, ele me adora.
HELENA - Tivesse eu risos feios desde agora!
HÉRMIA - Digo-lhe doestos, e ele amor me vota.
HELENA - Quem me dera na voz tão doce nota!
HÉRMIA - Vai de par seu ardor com o meu desdém.
HELENA - Com o seu desprezo o meu amor também.
HÉRMIA - De tal loucura a culpa não é minha.
HELENA - É de tua beleza. Fosse a minha!
William Shakespeare